Contra Dicção

Carlos Lopes

 

 

Acordado, estou vivo

E vivo também a dormir

Neste agora relativo

Logo absoluto existir

 

Das noites também sou cativo

Novos dias sempre a vir

E choro porque vivo

Assim mesmo a sorrir

 

Ai sim, sou um fujitivo

Pois ficar pode ser partir

Sonho um sonho furtivo

E volto ao real persistir

 

Se é muito bom ou nocivo

Assim de ser decidir

Sem mente ou pensativo

Estou sempre a evoluir

 

Da funda terra derivo

E rumo a ela vou ir

Mais activo ou mais passivo

Levanto-me depois de cair

 

Pois tudo é oscilativo

Para a média se cumprir

Zero é o grande objectivo

Que o infinito quer medir

 

Pupila ou ouvido gustativo

Água ou fogo a desistir

E cheiros com ar expressivo

Sou livre de atribuir

 

Qualquer  vulgar adjectivo

Dá-me vontade de rir

Há quem esteja morto vivo

E quem viva sem sentir

 

Medalha de Ouro Internacional da Académie Européenne des Arts (Gembloux) – Jun 2008